Acasos do amor

Brincávamos de fazer amor à sombra das árvores. Víamos as folhas serem levadas pelo vento, de um lado para o outro, e falávamos sobre aquela dança. Com a ponta dos dedos indicávamos o percurso que faziam. Lá se vão e eis que para aqui sempre se volvem. Dizíamos que aquele era um reflexo do nosso caminho. Deixamos o acaso nos levar, assim como as folhas deixam o vento - comparávamos. 
Seus olhos me fitavam intensamente, com certo brilho e ternura, enquanto minhas pupilas se dilatavam, em verdadeira resposta química à paixão. 
- Que é o amor senão isso que temos?
- O amor é saber que isso não é algo que temos.
- O que quer dizer com isso? - indagou-me.
- Ora, o amor é algo que nunca se tem, impróprio pra esse verbo possessivo. O amor é a plena ciência de que isso é agora e, ainda assim, não tememos.
- Mas você me ama?
- Claro! Tal como nunca me amará de volta.
- Por que pensa assim?
- Porque sei o quão de mim você não conhece e, desde já, peço desculpas.
- Que história é essa, meu amor? Não pense assim.
Vimos uma folha cair e fomos arrastados pelo silêncio durante alguns minutos. Sabíamos que o imediatismo do amor cabe em pouco e todas aquelas promessas eram descabidas. Ainda assim, mentíamos com fervor, na medida em que falávamos apenas com o coração. Aquela foi nossa árvore por longos anos e, agora, deu lugar a um bonito prédio. Nosso amor, que nunca foi nosso, continua vivo. A despeito das folhas que caem, permanecemos na dança das que ficam. E, com o mesmo brilho e ternura, somos levados de um lado para o outro, em uma eterna valsa que sempre nos faz encontrar novamente. 

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