Postagens

Mostrando postagens de dezembro, 2015

Buraco

O dia seguia ameno, as cores frias mesclavam-se ao ar denso, deixando a sensação de estarmos vivendo mais uma tarde que não seria lembrada e, se eventualmente fosse, faríamos questão de esquecê-la novamente. Os caminhos estavam bem delineados no trilho, seguíamos feito máquinas bem programadas, personificando aquelas que a Revolução Industrial nos deixou de herança. Normal. Acostumamos a usar coleiras e já não nos sentíamos revoltados pelo puxão que, vez ou outra, poderia ser mais forte.  O descaso se estampava em nossas caras que, cansadas pelo desgosto, já não manifestavam muitas contradições. Sabíamos que os reis e rainhas do baralho eram como nossos donos – sim, fomos feitos números ao longo dos séculos sem que nos déssemos conta – e por isso, poderiam nos conduzir como bem quisessem, do contrário, padeceríamos às mazelas mundanas. De toda a multidão, às vezes um ou outro se destacava. Os curingas. E logo hão de pensar que pelo trabalho bem prestado, o que não poderia ser ma

Paródia reflexiva - Camões às avessas

A raiva é fogo que arde sem se ver, é ferida que dói, e não se sente; é um contentamento descontente, é dor que desatina sem doer. É um não querer mais que bem querer; é um andar solitário entre a gente; é nunca contentar-se de contente; é um cuidar que ganha em se perder. É querer estar preso por vontade; é servir a quem vence, o vencedor; é ter com quem nos mata, lealdade. Mas como causar pode seu favor nos corações humanos amizade, se tão contrário a si é a mesma raiva?